Cipher

Na pólis caída dos bandidos, Dolos, os 300 Renegados correm desenfreados e livres.
Avance sem hesitação, ágil Estrela Ladra Cífera, Herdeira de Chrysos da Chama Primordial da "Trapaça". Que sua teia de mentiras se espalhe com a brisa por todas as terras.
"Tentando me enganar? De jeito nenhum!"

"No final do Mês da Tecelagem, pão, um saco de frutas secas e várias velas foram furtados do templo.
Embora o valor dos itens possa ser trivial, sacrilégio e desordem merecem punição severa.
A suspeita tem cabelo grisalho, orelhas de gato e porte franzino. Considerada ágil e astuta. Cautela é recomendada.
Oferece-se recompensa: 5.000 por pistas. 10.000 se capturada com vida."

Um pôster de procurado em Dolos

"Pegue-a, pegue-a!"
A praça era ladeada por celas, fedorenta de esgoto bruto e ecoando com estalos de chicotes e lamentos.
Uma garota em trapos esfarrapados corria pelas ruas lotadas, deixando um rastro de sangue dourado atrás de si.

Ela passou correndo pela plataforma, onde um sacerdote barrigudo fazia um sermão para os fiéis reunidos da pólis.
"Pela graça de Kephale, louvemos e demos graças por este mundo maravilhoso..."

"Integridade, honestidade, misericórdia..."
"Reguemos nossas almas com virtude e usemos o amor para suavizar a tragédia..."
Bem no momento em que a garota olhou para trás, os cães raivosos que a perseguiam avançaram, abrindo três cortes profundos em seu rosto.

"Tesouros e riquezas nada significam para os Titãs, mas provam sua devoção..."
Em meio aos aplausos, sedas, iguarias e joias choveram sobre o palanque, formando uma pequena montanha.

"Rejeitai as mentiras dos Herdeiros de Chrysos. Tende fé em Kephale, orai com sinceridade, e a divindade vos trará a salvação..."
Ela se espremeu pela multidão, o pão em sua mão perdido em algum lugar ao longo do caminho.
Ela olhou ao redor, desesperada, apenas para ver rostos que a observavam, avançando em sua direção como uma maré inquieta.

Suas pernas vacilaram. Olhares de escárnio e sorrisos ameaçadores desfocaram diante de seus olhos.
Mas as vozes distantes já haviam cravado os dentes em seus ouvidos, e por isso ela não podia parar.
"Ladra!"
"Criminosa!"
"Miserável!"

Ela fechou os olhos e pulou daquele muro de cem metros.
"Tão... faminta..."
Águas geladas afogam sua consciência.
Com sua vida como aposta, outra vitória pírrica nesta perseguição mortal.

Vagando até a pólis sagrada do amanhecer, ela encontrou os ecos das lendas dos Herdeiros de Chrysos pela pólis. Mas, ao ver seus becos e esquinas imundos, sentiu que este lugar não era tão diferente de Dolos.

"Hunf! Perseguição às Chamas? Heróis? Cífera, com o que você sabe da vida, isso aí é arapuca!"
Considerando os Herdeiros de Chrysos como fraudes famintos por glória, ela mira uma oficina de tecelagem dourada.
"Hidromel? Tabuleiro de xadrez... e um alaúde estranho? Coisa boa de levar..."
Ela bebe o hidromel, devora o arroz com folhas de uva e brinca com as peças de xadrez de cristal.
"Hehe, até o chão está girando..."

Quando ela acordou de ressaca, encontrou uma carta perfumada em sua mão.
Com um arrepio percorrendo sua pele, ela jogou o cobertor para longe e recuou para seu covil sombrio.

"Pequena Glutona:
Está se divertindo? Transformou o salão de tecelagem em um parque de diversões para suas travessuras imprudentes.
Provou o hidromel, mas não aguentou. O tabuleiro de xadrez está uma bagunça, e nem mesmo o velho alaúde escapou.

Há algo que você deve lembrar: o hidromel deve ser terminado, e sempre há espaço para mudança no mundo.
Sei que suas habilidades são impressionantes, então vá consertar o alaúde que você danificou. Felizmente, aquela comandante cavaleira não estava aqui, senão ela teria pregado sua cauda com sua espada."

Segurando a carta confidencial, a garota sentiu uma emoção vaga e indescritível surgindo dentro dela pela primeira vez.
"Esse pessoal das grandes pólis... realmente tem muitos truques na manga."

A gata perdida esperou dia após dia, mas nenhuma repreensão severa jamais veio.
Então, ela assobiou, jogou uma moeda para o alto e, repetidamente, "acidentalmente" parava em frente à loja de tecelagem.
"Ciphizinha, se você quiser algo para comer, é só 'nos' pedir diretamente!" As meninas de cabelo vermelho sempre tinham um monte de comida preparada.
Enquanto acompanhava o trabalho da tecelã, ela sempre ouvia histórias desses heróis.

"Para os de sangue dourado, a Perseguição às Chamas é uma jornada de perdas infinitas... até a própria vida tem pouco valor."
As tecelãs falavam sobre o último lamento do violino, as peças de xadrez que caíam em um jogo condenado, os caminhos quebrados que se dividiam em mil fragmentos...
"...E o que isso tem a ver comigo? Eu só quero encher a barriga."
Ela resmungou, enrolando os dedos. Uma minúscula gota de sangue dourado brotou de sua ponta do dedo ferida.

Naquela noite, ela escapuliu silenciosamente da oficina de tecelagem mais uma vez.
"Tudo bem. Corra, Cífera.
Só você sabe onde seu destino vai terminar..."
Sob o luar, sua figura desapareceu de vista, deixando para trás apenas os murmúrios das tecelãs na sala.

"Zagreus, a antiga divindade da Trapaça:

Roubando tesouros, provocando as divindades, incitando conflitos...
Estamos cansados de seus velhos truques.
No próximo Dia dos Espíritos, os 300 Renegados encenarão sua performance mais espetacular até hoje em Amphoreus.

O mundo será nosso para reivindicar, divindade covarde!
Observem enquanto o viramos de cabeça para baixo!"
Uma proclamação adornada com pegadas de patas de gato, espalhadas pelas pólis de Amphoreus.

"De Okhema, é só seguir para o norte, atravessar as montanhas cobertas de neve, e você vai chegar em Aenionus.
Lá, eu alterei dois caracteres no Código de Granito no sigilo, e ganhando o caso de um renegado no julgamento de pena de morte.
Na baía do sul, eu me enfiei num navio ancorado e lutei com um bandido no meio de uma tempestade. Argh, eu odeio água mais que tudo nesse mundo!
E adivinha? Genial que eu sou, eu peguei o meu Puxador e roubei a espada dele!
E tem mais... com aquele sol escaldante do deserto no lombo, eu competi com bandidos para ver quem aguentava mais tempo sem beber água, e no meio do mato, eu apostei corrida contra os caçadores... até que todos os 300 Renegados encontraram o lugar deles de novo..."

A garota de botas douradas falava animadamente sobre sua jornada.
"E então, já está na hora de cada usurpador, parasita e escravocrata de toda Amphoreus ver do que esse povo que eles chamam de vagabundos são capazes!"

Ela lembrou do momento em que a Moeda do Capricho caiu, trezentas Estrelas Ladras riscaram o céu, descendo sobre as terras de Amphoreus.
Os tiranos arrogantes caíram de seus tronos, os escravocratas com chicotes fugiram em desonra, torrentes de ouro desapareceram no ar, só para chover dos céus sobre os famintos e os pobres...

Durante aquele grande espetáculo, Zagreus não resistiu à tentação e se revelou, caindo diretamente na armadilha dos Herdeiros de Chrysos.
A Chama Primordial ardente, enfim, se silenciou no núcleo do vórtice.
Na pólis de Okhema, começaram a se espalhar boatos sobre uma Semidivindade ágil como uma sombra, uma guardiã dos andarilhos, um flagelo para os ímpios...

"A única coisa que eu sei fazer é correr."

"A todos os sacerdotes, altos sacerdotes e acólitos das pólis, aos fiéis sob o brilho do Trono dos Mundos, e a todos os seres sencientes:

Desde o falecimento do Alto Sacerdote, a Joia de Todos os Mundos desapareceu.
Após uma investigação, não foram encontrados sinais de arrombamento ou danos no local. Após o roubo, vários relatos afirmam ter visto a joia entrar no mercado negro, onde foi trocada por uma grande quantia de Moedas de Equilíbrio.
Quem fornecer informações valiosas receberá 5.000 Moedas de Equilíbrio. Aquele que capturar o culpado será recompensado com 100.000 Moedas de Equilíbrio."

Uma proclamação desbotada do Conselho dos Anciões
"Faz um tempo que eu voltei, e ainda não tiraram isso daqui?"

Ela se lembrava do dia em que o aviso foi afixado, do momento em que não teve escolha senão dizer adeus.
Ela não conseguiu olhar a tecelã nos olhos, sendo capaz apenas de se virar e fugir de Okhema às pressas.

Séculos depois, novos heróis surgiram por toda Amphoreus. Encapuzada, ela observou o antigo mercado à distância, mas poucos rostos familiares restavam.
"Balas de picles com um novo sabor?"
Ela amassou o embrulho e o jogou casualmente na cama de flores.
"Bolinhas de gude? Eu não brincava com isso há séculos!"
Ela pesou uma na mão, mirando enquanto a jogava na água.
...
Momentos depois, da cama de flores, da água, das árvores... figuras vestidas como assassinas caíram uma após a outra.
E à frente, banhada em luz, estava a jovem heroína, retornando em triunfo.

Ela observou das sombras até que o fio dourado ao seu lado tremesse.
"Tecelã, depois de tanto tempo, seu fio dourado ainda está tão afiado quanto sempre. Se eu não quero ser pega por você, é melhor eu vazar!"

Ela se espreguiçou preguiçosamente, agachando-se ligeiramente enquanto o vento passava, carregando o cheiro da natureza.

Um raio dourado disparou novamente de Okhema em direção à noite eterna.
No vento uivante, ela sentiu como se tivesse retornado à sua infância, para aquelas inúmeras corridas onde a própria vida era a aposta.
"Corra, Cífera...
Só você sabe onde seu destino vai terminar...
E um dia, você será capaz de correr em direção a esse futuro brilhante..."

No instante em que o relâmpago dividiu a noite, foi como se ela já tivesse iluminado o mundo inteiro.